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Entrevista com João Ricardo da Matta, especialista em Pesquisas de Mercado. Vai falar conosco sobre os mitos de uma pesquisa e os riscos que ela traz, mal planejada e encomendada.

Quando o empresário tem dúvidas sobre alguma ação comercial a ser implementada ou quanto ao lançamento de algum produto, muito freqüentemente vislumbra a pesquisa como fundamental para a sua tomada da decisão. Estará ele agindo corretamente ao contratar uma pesquisa?

Segundo João Ricardo, com quem conversaremos a seguir, para esta pergunta existem duas respostas possíveis. “Uma olhando para o processo prático, afinal, grandes empresários vem usando seu feeling para dirigir suas empresas desde o início dos tempos capitalistas.”

Nesta linha de raciocínio João Ricardo nos responde que para estes casos, a pesquisa é absolutamente dispensável. Entretanto, ele pondera, a outra forma seria responder com uma pergunta: “por que tomar uma decisão sem nos utilizarmos do instrumento de pesquisa? Imagine que você chega em casa e vê seu filho pequeno deitado e parecendo adoecido. Você se aproxima, coloca a mão nele e acredita que ele está com febre. O que você faz? Vai para a caixa de remédios pegar um antitérmico, ou vai na mesma caixa de remédios pegar um termômetro para se certificar do que você está intuindo? Claro que como pai ou mãe, você bem sabe que ele está com febre, mas prefere certificar-se antes de tomar uma decisão – afinal, o termômetro está lá, disponível, para evitar que você tire uma conclusão errada. Da mesma forma, no mundo empresarial, a pesquisa pode ser um elemento facilitador e de diminuição de riscos no processo de decisão.”

João Ricardo vai mais além:
“Como um executivo reconhece as oportunidades que surgem no mercado? Seus clientes estão querendo mudanças? E os concorrentes vem criando produtos e serviços mais sedutores que os seus? Seus fornecedores estão entregando-lhe o melhor insumo, com os preços mais competitivos? Essas são apenas umas poucas, das infindáveis questões que poderíamos responder com um pouco mais segurança, caso utilizássemos o instrumento de pesquisa. Mas, e quando não se deve usar a pesquisa? Já pensou nisso? Sim, há casos em que a pesquisa não é recomendada.”

João Ricardo também nos fala sobre o Sistema de Informação de Mercado, segundo ele, “uma poderosa e simples ferramenta que as empresas acabaram deixando de lado com o passar dos tempos.”

Neste papo inicial, ele mesmo nos coloca outras questões que suscitam interesse:
“Mas e as pesquisas erram? Esta é uma questão que precisa ser desmistificada pois faz parte de alguns dos dogmas do marketing e da visão popular sobre o tema.”

Por fim, para aguçar nossa curiosidade ele questiona: “que tipo de respostas devemos esperar ou não das pesquisas?”

A seguir, entrevista com João Ricardo:

Cláudio Rocha Miranda: João Ricardo, falando para os empresários em geral como você conceituaria pesquisa de mercado?
– João Ricardo: A American Marketing Association define pesquisa de mercado como a função que liga uma organização a seu mercado por meio da obtenção de informações. Mas eu prefiro definir como a ferramenta que permite ao gestor minimizar os erros das decisões relativas ao mix de marketing. Aqui, em mix de marketing, entenda-se os 7 P’s – aquele conceito dos 4 P’s do Kotler, adicionando-se mais 3 P’s relativos à experiência do consumidor.

Cláudio Rocha Miranda: João Ricardo, quais são exatamente os P’s a que você se refere?
– João Ricardo: Bem, além daqueles clássicos que todo mundo conhece desde os anos 70, que eram os P’s de Price, Promotion, Place e Product, temos hoje em dia mais 3 P’s, que se referem justamente à experiência do consumidor – tema tão importante nas empresas. Estes outros 3 P’s os quais a literatura do marketing hoje incorporou, são: o People – relação com stakeholders (empregados, acionistas, sócios, imprensa, analistas, público em geral); o Physical Evidence (alguns falam de Packaging) – que é o que o consumidor vê e sente antes da compra – entender verdadeiramente a perspectiva do cliente; e por último o Process, que é justamente a relação entre valor, satisfação, suporte, conveniência, experiência, educação e recompensa. Esses 7P’s em conjunto é que, de verdade, compõem o novo mix de marketing das empresas.

Cláudio Rocha Miranda: De modo geral, para que servem as pesquisas?
João Ricardo: Pois é, exatamente para minimizar erros de decisão. Isto não significa que com a pesquisa auxiliando o executivo, ele não vai mais errar. Mas, com certeza, significa que as chances de erro ficam, consideravelmente, menores.

Cláudio Rocha Miranda: Você diria então, que elas são sempre de utilidade?
-João Ricardo: Nem sempre. Há casos em que as pesquisas não são indicadas. Em minha vida profissional, fui testemunha de vários casos em que a pesquisa não era uma opção pertinente. Por isso as empresas devem ficar atentas para não desperdiçarem nem tempo, nem foco, muito menos dinheiro, em ações desnecessárias ou não apropriadas. Apenas para citar um exemplo, é muito comum as empresas realizarem pesquisas quando não tem verdadeiramente tempo hábil para tal. Isso é um erro clássico. Precisam dos resultados da pesquisa antes do prazo razoável para que estas sejam desenvolvidas e aplicadas de forma que suas conclusões sejam coerentes e, sobretudo, úteis como auxiliar no processo de tomada de decisão. Quando isto ocorre, o resultado é o pior possível levando a conclusões equivocadas e via de regra, desastrosas.

Cláudio Rocha Miranda: Se nem sempre elas são úteis, é possível afirmar que para algumas atividades, para alguns tipos de empresas elas são mais importantes de serem feitas, ou mesmo fundamentais, do que para outras?
João Ricardo: Acho que é importante para qualquer empresa ou negócio. O que vai pesar é a disponibilidade de tempo, de dinheiro e do foco de cada empresa ou de cada negócio, especificamente.

Cláudio Rocha Miranda: Na palestra que você fez para o nosso Grupo Vistage constituído por líderes empresariais, aqui no Rio de Janeiro, você destacou a importância das empresas manterem um Sistema de Informação de Marketing atualizado. Fale um pouco deste conceito para a gente?
-João Ricardo: Isto é uma das coisas mais importantes que sempre procuro falar, em minhas palestras. Quando um executivo percebe a importância e a relação custo/benefício de um eficiente sistema de informação de marketing, ele não para nunca mais de monitorar o mercado. Os gestores têm quase sempre a idéia de que o melhor resultado virá de uma pesquisa externa à empresa. Só que com isso, acabam esquecendo de que as informações mais valiosas podem não custar um centavo. Quer alguns exemplos? Pergunte a um grupo de executivos se eles sabem o preço que seus 5 principais concorrentes estão cobrando naquele momento. Ou se eles sabem que tipo de ações de marketing esses mesmos concorrentes estão fazendo naquele momento? Essas duas óbvias informações não custam praticamente nada. Um estagiário poderia colher estas informações nos sites dos concorrentes com o simples monitoramento regular. Digo sempre: monitorar é uma arma poderosa. Pena que poucas empresas se deram conta disto. Um Sistema de Informação de Marketing é exatamente este monitoramento de informações e que, quase sempre, estas estão disponíveis no mercado. O que precisa é a empresa implementar uma rotina para monitorar com a freqüência adequada, estas informações.

Cláudio Rocha Miranda: Você diria que existem casos em que a pesquisa não é recomendada?
-João Ricardo: Sim, sem a menor de dúvida.

Cláudio Rocha Miranda: Dá para citar exemplos?
-João Ricardo: Claro! Além da situação do tempo inadequadamente curto entre a contratação da pesquisa e seus resultados, já mencionado, outro caso é quando o retorno desta informação não trará resultados financeiros proporcionais aos investimentos que ela própria, pesquisa, demanda para ser realizada. Há que haver bom senso no julgamento de coisas assim…

Cláudio Rocha Miranda: Com a explosão das redes sociais, muita coisa mudou no mundo empresarial. Como a pesquisa de mercado foi afetada?
-João Ricardo: A Internet transformou o mundo, os consumidores e as empresas. É claro que a pesquisa de mercado também foi impactada. Hoje os custos podem ser muito menores que antes, utilizando-se novas plataformas e novas tecnologias. Uma das técnicas que mais vem se desenvolvendo nos últimos tempos é a netnografia. Uma espécie de estudo antropológico do comportamento do cliente através da Internet.
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Cláudio Rocha Miranda: Fale um pouco mais da “Netnografia”?
-João Ricardo: Claudio, isso está mudando os estudos antropológicos relacionados ao consumo. Antigamente era caríssimo fazer um trabalho antropológico para “mergulhar” no mundo do consumidor. Hoje em dia, os preços tornaram-se muito razoáveis mesmo, pois, por exemplo, você pode fazer uma excelente análise antropológica baseado nas redes sociais que seus consumidores navegam. Você tem dúvida que dá pra conhecer bastante uma pessoa analisando apenas suas redes sociais? Faça um teste você mesmo. Escolha um de seus amigos que está no Facebook e navegue lá no perfil dele com este “olhar”. Tenho certeza de que você vai ver que consegue “enxergar” diversas características de seu “amigo”, mesmo que não o conheça pessoalmente. É isso que faz a netnografia. Uma análise com inspiração antropológica, só que ancorada na Internet.

Cláudio Rocha Miranda: Fale um pouco mais sobre ela? Que empresa oferece isto, no mercado? Quanto custa? É acessível à médias empresas? É mais apropriada para empresas de algum tipo de setor do que para outras? Uma pesquisa de mercado deste tipo, o que responde, especificamente?
-João Ricardo: Ainda há poucos profissionais responsáveis atuando neste segmento, mas eu diria que, por se tratar de uma tendência, muito em breve já será mais fácil de contratar profissionais para fazerem netnografias. Quanto ao preço, fica difícil te dar uma idéia em termos genéricos, mas sim, eu digo com tranqüilidade que esta técnica é mais barata que uma pesquisa quantitativa e que por isto, sem dúvida, é acessível também, à pequenas empresas. Quanto a especificidade de um segmento que poderia se beneficiar desta técnica mais que outros, acho que não. Vai depender do caso a caso, mas, em tese, qualquer segmento pode-se utilizar cada vez mais desta técnica, deste novo formato de pesquisa.

Cláudio Rocha Miranda: Quando devemos utilizar a pesquisa online ao invés dos métodos tradicionais?
-João Ricardo: Não tem fórmula cartesiana, e diversas questões devem ser avaliadas. Mas eu arriscaria dizer que, em princípio, se o seu público alvo a ser entrevistado tem acesso e usam a internet e, ao mesmo tempo, você é capaz de selecionar uma amostra deste target com qualidade, eu diria que sim, você deve utilizar a pesquisa online.

Cláudio Rocha Miranda: E o contrário. Isto é, em que casos uma pesquisa online não se aplica? Outra pergunta embutida nesta: as pesquisas online são mais do tipo quanti do que quali?
-João Ricardo: Acho que, por exemplo, quando seu público em potencial não tem familiaridade com a Internet, deveríamos evitar a pesquisa online. Por exemplo, quando se quer conhecer algo sobre terceira idade. Embora possamos usar a pesquisa online em ambos os casos, sem dúvida, ela é muito mais freqüente na quantitativa.

Cláudio Rocha Miranda: Você pode me dar alguns exemplos de casos específicos onde a pesquisa é importante de ser feita?
-João Ricardo: A pesquisa pode se aplicar a infinidade de casos empresariais. Algumas vezes usamos técnicas quantitativas, em outras as qualitativas. Na verdade sou mais fã das qualitativas, pois elas têm um caráter exploratório – me dá um pouco uma sensação de ser um detetive, que acaba descobrindo aquele crime quase perfeito… Nas qualis, os casos mais comuns são:

  • Mapear determinado problema ou produto, em relação ao qual não se disponha de informações anteriores;
  • Verificar mudanças de valores, hábitos e atitudes do consumidor;
  • Avaliar reações a novos produtos ou a mudanças em produtos já conhecidos, inclusive de embalagens, rótulos, sabores, aromas, cores, etc;
  • Qualificar o posicionamento de determinada marca num segmento de mercado;
  • Conhecer os motivos que balizam a preferência ou a rejeição a determinadas marcas ou produtos;
  • Interpretar informações novas, inesperadas ou imprevistas, obtidas em pesquisa quantitativa anterior.

Cláudio Rocha Miranda: João Ricardo, super obrigado. Gostaria de finalizar dizendo algo mais?
-João Ricardo: Gostaria de fechar este papo, comentando que alguns amigos dizem que sou muito crítico em relação a pesquisa de mercado e que, eventualmente, quem não me conhece bem pode até pensar que eu não acredito nelas. Mas claro que isso não faz nenhum sentido. A pesquisa é uma poderosa arma para o executivo responsável. O que eu defendo e acredito que precisa ser feito é uma análise criteriosa de quando, como, onde e porque utilizar-se a pesquisa de mercado. Se o executivo tiver esse cuidado, seguramente ele ficará satisfeito e a incorporará em seu modo gerir seus negócios.

João Ricardo Matta, é profissional na área de negócios e marketing há 22 anos, dos quais mais de 10 dedicados à Internet. Atualmente além de professor e consultor, faz palestras em empresas e também como foi no nosso caso, para grupo Vistage de Presidentes, CEO’s, Diretores, Sócios e Sucessores. Além de passagens por agências de propaganda, foi diretor de empresas como Grupo Opportunity, Jornal do Brasil, Jornal dos Sports, Rádios Jovem Pan e Paradiso FM, entre outras. Atualmente, além de Professor dos MBAs’ da FGV, FACHA, Veiga de Almeida e Infnet, é consultor de empresas para as áreas digital e de negócios. Sua formação acadêmica é de Mestre em Administração pela PUC Rio, pós-graduado em Marketing pela Florida International University (USA), com MBA em Telecomunicações e TI pelo IBMEC Rio.

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