Entrevista baseada na palestra sobre Terrorismo, Extremismo e Criminalidade proferida pelo Prof. Francisco Carlos Teixeira da Silva – Assessor do Ministério da Defesa – Instituto Pandiá Calógeras – ao Grupo Vistage-CRM de empresários – coordenado por Cláudio da Rocha Miranda, no Rio de Janeiro.
“O terrorismo atualmente é espetaculoso, midiático e pedagógico”
Sediando as Olimpíadas o Rio de Janeiro parece possuir o cenário perfeito para que ocorram atentados terroristas. Ataques na França, às vésperas dos jogos Olímpicos, só fazem aumentar nosso receio. O Professor da UFRJ/ECEME/Escola Superior de Guerra e do Instituto Pandiá Calógeras – Ministério da Defesa, Chico Carlos – um super especialista no assunto, conversou com o grupo VISTAGE – CRM por cerca de duas horas – que mais pareceram 15’ – sobre o tema. De modo geral, mencionou como estes grupos se articulam, o que buscam e quais seus comportamentos mais frequentes, se é que é possível falar de “frequência” em atos terroristas. Falou-nos também sobre uma possível nova onda antissemita e do xenofobismo, inspirador de grupos radicais de direita.
Como as palavras o vento leva, convidei-o para uma entrevista que tem como base os tópicos mais relevantes da palestra que fez para o nosso grupo.
Confiram a seguir:
De forma simples e direta, se é que podemos tratar o assunto desta forma, diria que o Terrorismo deixou de ser um assunto “local” ou “regional”, circunscrito ao um território, região ou “teatro de operações” – como a Irlanda, Espanha ou Colômbia entre outros – para tornar-se um fenômeno global, sem uma “frente” de luta, difuso e capaz de acontecer em qualquer momento ou lugar. Também não há um alvo predileto – policiais, políticos, ou um grupo étnico ou religioso – passando a ser um fenômeno de massa.
O objetivo imediato do Terror é causar o medo, a desconfiança e a insegurança geral visando assim, ao amedrontar a população, obrigar os governos a desistir de uma determinada política, retirando deste governo a legitimidade do aceite popular. Assim, o “centro de gravidade” a ser atacado pelo Terror não são as forças militares do adversário – embora, claro, possam ser atacadas – mas, prioritariamente, a população que legitima o governo.
Vivemos, no momento, e isto é o que mais preocupa, uma “onda” de terrorismo de massa – de vitimização de massa, de ações de massa e, através de meios de comunicação massivos, que devem sempre que possível ( para a lógica do Terror) estar presente no ato de Terror. A principal organização terrorista hoje é o Daesh, ou Califado Islâmico, que não possui quaisquer escrúpulos quanto ao estabelecimento de objetivos ou métodos. Dispensa, se necessário, longas e custosas operações – como a Al-Qaeda fez no 11 de setembro de 2001. O Daesh, utiliza-se dos meios digitais, dos sítios eletrônicos, do twitter, do Telegram, entre outras ferramentas para mobilizar voluntários em qualquer parte do mundo. Sem que haja necessidade de qualquer ligação com o regime estabelecido na Síria-Iraque.
Claro, ao queimar ônibus e atacar instituições do Estado de Direito utilizam-se de “métodos” terroristas, embora seus objetivos possam ser mais limitados ou sem um programa político. Contudo, podem, claramente, paralisar a ação de um governo legitimo, substituir o poder do Estado sobre algumas populações e desacreditar o regime.
Há uma larga vaga antissemita, muito comum em organizações de extrema-direita nos Estados Unidos, como a “Aryan Nation” e outras, além de uma associação perversa do antissemitismo e simpatia pela Palestina. Vários partidos e entidades de cunho xenófobo, na Europa e nos EUA, fizeram renascer o antissemitismo nos nossos dias.
Chamamos de “janela de oportunidade” a conjunção de fatores, alguns de caráter subjetivo, que ocorrem para facilitar o ato terrorista. O Terror é uma prática, além de cruel, “oportunista”, que visualiza locais, organizações, momentos que ofereçam as maiores oportunidades para o êxito da ação terrorista.
Não, o Terror atual é massivo, busca – através de meios potentes ou de ações simultâneas e/ou sequencias – potencializar o máximo possível o ato terrorista. Evidentemente, países e instituições que tenham alguma relação com o conflito com o Califado Islâmico estarão, sempre, mais sujeitos à premeditação terrorista.
Nos últimos 90 dias – maio, junho e julho de 2016 – apesar dos violentos ataques ao Daesh, e seu recuo territorial, tivemos ataques massivos em Bruxelas, Orlando, Istambul, Dacca, Bagdad e mais uma vez na França , em Nice. Mataram centenas de inocentes. Ou seja, o Ocidente e seus serviços não estão conseguindo fazer um trabalho conectado, organizado e preventivo ao menos para garantir alertas prévios.
Difícil de dizer: Alemanha, Israel, possivelmente… Mas, isso não garantiu, nem poderá garantir, a ausência de ataques.
Tais instituições são profissionais… Se vazar é despreparo. Esta não é uma variável aceitável.
O Terror das FARCS não é o Terror do califado islâmico: combater ambos da mesma forma seria um erro total. Por sinal, no momento as FARCS discutem um tratado de paz com o governo da Colômbia. O Califado Islâmico visa a total destruição do adversário e não um acordo vantajoso.
O ato terrorista é massivo, público e busca a maior difusão possível (ao contrário seria “sabotagem”). O caráter pedagógico do ato terrorista (note bem, “pedagógico” aqui tem sentido metafórico ) visa dois objetivos: aglutinar e incentivar seus aliados e amedrontar seus adversários, mostrando que mesmo que este seja poderoso – EUA, França – um ente bastante menor e menos dotado de meios financeiros e tecnológicos, poderá atingi-los, mesmo no coração de suas capitais.
O caráter óbvio das Olimpíadas e das delegações estrangeiras enquanto alvo é claro. A elevada concentração de meios de comunicação no mesmo local combinada com a reconhecida incapacidade do governo local controlar o crime organizado pode gerar uma “atração fatal” sobre qualquer evento que reúna muita gente. Assim, meios de transporte, casas de espetáculo e restaurantes, com a presença de estrangeiros, passam a serem também, alvos substitutos possíveis.
Estamos preocupados com os rumos das relações internacionais e a crise das instituições globais, hoje tão ameaçadas, e não só pelo Terror. Hoje, a continuidade da crise econômica, a xenofobia, os amplos movimentos de imigração, a ressurgência do racismo e do seu pior exemplo, o antissemitismo, são ameaças brutais à paz. Em conjunto, tudo isso desperta o interesse de qualquer pesquisador, historiador.
Espero poder contar com você outras vezes. Parabéns pela palestra e muito obrigado pela entrevista!